A fé através do medo em O Diabo de Cada Dia | Resenha + Curiosidades

   


Eis que o filme finalmente chegou na Netflix e deixou o público divido.

A produção de Jake Gyllenhaal e Randall Poster, com direção do nosso conterrâneo Antonio Campos e inspirada no livro de Donald Ray Pollock é um bocado polêmica pro público da plataforma.

A convite da Cinema Atemporal, estou trazendo mais uma resenha pra vocês. Espero que gostem e que visitem a página deles e os acompanhem no youtube!


Sem spoilers pra fazer vocês assistirem, só tem meus comentários após a postagem.


Resenha

O filme O Diabo de Cada dia começa com uma narração do escritor Donald Ray Pollock, o autor de "O Mal Nosso de Cada Dia". Donald nos conta a história de alguns norte-americanos atormentados pelo fim da guerra. A narrativa entrelaça personagens e acontecimentos que permeiam consequências fatais.

O personagem principal desta trama é o interior de Ohio nos Estados Unidos da década de 50', com habitantes hostilizados por sua fé. A religião é o principal fio condutor da trama, que leva Willard Russell a ensinar a seu filho Arvin o jeito "torto" de crer em Deus através do medo. E é quando sua esposa Charlotte está a beira da morte por causa de um câncer, que Willard coloca sua fé a prova e entrega a Deus tudo o que tinha a sua disposição para que ela não morresse. 

O desenrolar da morte de Charlotte dá duras lições de vida a Arvin, interpretado por Tom Rolland, que futuramente segue os passos do pai, na sua melhor maneira de fazer o bem.

Outro questionamento na trama é o bem e o mal, já que o espectador se vê aceitando a mortes de alguns personagens em detrimento de outras. Morte é morte, não?

Falando em religião, um personagem sensacional que nos é apresentado é o reverendo canastrão Preston Teagardin, interpretado por Robert Pattinson. O puro suco do puritanismo hipócrita, da religião através da ganância e mais outros pontos que seriam spoiler aqui.

O xerife Lee Bodecker, estrelado por Sebastian Stan, possui uma trama fraca. O policial corrupto passou batido no filme, não impressiona. A atuação é boa, o personagem é que é descartável. Só ganha uma certa importância no fim do longa, mas ainda sim poderia ser encurtada.

Ainda sim, o longa é muito interessante nos aspectos que dizem a respeito de suas críticas, o patriarcado é escancarado em sua forma mais sutil. Quem liga pra mortes em série numa cidade tão pacata e pequena? Quem se importa com a segurança de jovens meninas? Quem se importa com o que é ensinado em pequenas igrejinhas no meio do nada?

A fé através do medo e da violência é o ponto crucial da vivência destes personagens. A distorção das palavras sagradas e a falta de respostas divinas, que fazem com que os fiéis busquem por si próprios como resolver suas questões mais intrínsecas.
O medo de se tornar seus genitores, fazem com que sua prole cometa os mesmos erros.

Não é o melhor filme sobre serial killers, guerra ou destino. Mas é o melhor deles sobre fé.

Curiosidades de O Diabo de Cada Dia

O longa conta com um elenco extenso de grandes estrelas de Hollywood:

Tom Holland como Arvin Eugene Russell

Robert Pattinson como Preston Teagardin

Bill Skarsgård como Willard Russell

Sebastian Stan como o xerife Lee Bodecker

Harry Melling como Roy Lafety

Mia Wasikowska como Helen Hatton

Jason Clarke como Carl Henderson

Conseguem pensar em demais filmes de cada um dos atores?
Me peguei imaginando essa farofa de Homem Aranha, com Edward Cullen, o Soldado Invernal com a Alice no País das Maravilhas e o It: a Coisa e o primo do Harry... Que loucura esse elenco!

Cena Rolland X Robert

No filme nós temos uma das cenas mais icônicas entre Tom Rolland e Robert Pattinson, e o diretor nos deu uma breve explicação de como ela foi feita:


Novos desafios para Tom

Tom Rolland revelou em algumas cenas dos bastidores como foi interpretar Alvin, para ele é muito importante a construção do sotaque.

"Em um filme como este o passo mais importante é acertar o sotaque.
Se você não entender o sotaque direito, é melhor não fazer." 

 


Tom ainda comentou sobre interpretar um personagem tão fora do aspectro do Homem Aranha:

"É empolgante pra mim ser capaz de interpretar este personagem que fala baixo, de um jeito mais lento, mas com uma voz mais ameaçadora."


Troca de elenco

Sebastian Stan não era a primeira opção do diretor Antonio Campos para interpretar o xerife Lee Bodecker.

Antonio gostaria que o xerife fosse interpretado por Chris Evans, porém a agenda do ator não permitiu a contratação, deixando o papel para Sebastian.

Lançamento do livro pela DarkSide

O Mal Nosso de Cada Dia saiu pela editora meses antes do seu lançamento na plataforma da Netflix.
Capa dura, caderneta de brinde e algumas curiosidades a mais sobre o autor, Donald Ray Pollock. Pra quem ficou com curiosidade, segue o link da DarkSide: https://www.darksidebooks.com.br/o-mal-nosso-de-cada-dia









Em uma cidade esquecida no interior de Ohio, a esposa de Willard Russell está à beira da morte, não importa o quanto ele beba, reze ou faça sacrifícios e oferendas. Com o passar dos anos, seu filho Arvin, uma criança negligenciada, torna-se um homem frio e cruel. Em torno deles, circula um nefasto e peculiar grupo de moradores — um insano casal de assassinos em série, um pastor que come aranhas e um xerife corrupto —, todos entrelaçados numa viciante narrativa da mais corajosa e sombria lavra americana.

Considerações a partir do filme (Spoiler)

É difícil julgar o Diabo de Cada Dia sem ter lido o livro, que deu origem ao roteiro de Antonio Campos. Mas acredito que filmes tem sua totalidade e devem ser interpretados como uma obra única, sem ter que recorrer a leituras de apoio. 

Creio que o filme perdeu seu ápice em algumas cenas. Ele é longo mas não é maçante, as duas horas do longa passaram rapidamente porque as tramas são muito boas. A única que me deixou sem me importar muito com o destino do personagem é a do policial corrupto. É uma trama fraca e sem muita importância pra trama principal, a de Arvin. 

Gosto muito como a abordagem a cerca da fé e da influência religiosa é posta aqui. Os fanáticos e seus seguidores. A forma como cada um enxerga Deus a sua maneira e todos seguem perdidos porque não possuem respostas do criador. As cenas de Willard ensinado seu filho a rezar são um lembrete de tudo o que passei quando era cristã: medo do castigo, medo do destino, medo de não rezar o suficiente.

Ao mesmo tempo que temos Willard desesperado com sua esposa morrendo de câncer, temos o casal de serial killers que matam pra ver suas vítimas pedindo misericórdia por suas vidas. Carl Henderson, o fotógrafo, me parece um cretino brincado de ser deus. E convence.

A trindade do filme segue o padrão de violência e fé. O reverendo Preston Teagardin que manipula e oprime através da religião, o serial killer Carl que encontra Deus na morte e Arvin que usa o misto dos dois achando que é um justiceiro divino.

Atuações impecáveis, elenco pesado e um roteiro que tem potencial mas enfraquece. O final com o poder do protagonista não agrada. Arvin mata o policial e sai em busca de uma nova vida.

Se o xerife Lee Bodecker tivesse acertado o tiro o fim seria muito mais intrigante. Como aquela pequena cidade lidaria com um justiceiro? Será que Arvin conseguiria justificar a morte do padre com a vingança pelo abuso da irmã? Ele seria perdoado por matar o casal de serial killers? Seria reconhecido como alguém que aliviou o mal daquele lugar? Ou ele seria dito como um matador terrorista que foi pego pelo grande xerife salvador do dia?

Seria um final muito mais instigante, pra mim.

E antes que eu dê meu último palpite, tenho que falar de Roy Lafety, o homem de fé que colocou Deus a prova e se arrependeu. Que se perdeu em suas próprias mentiras. Que acreditou ser capaz de "fazer o Jesus" e ressuscitar a pobre da Helen Hatton, uma coitada que estava fadada a servir nesse patriarcado padrão. 

Roy existe em qualquer esquina, e está dizendo por ai que crê que Deus o livrará do corona, que ele não precisa de máscara pois sua fé o guardará.

Real. Uma pena.



Comentários

  1. Mais um ótimo texto! O filme nos leva a refletir sobre diversos aspectos. Um acerto no mar de esquecíveis com selo Netflix. Parabéns Sá!

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    Respostas
    1. Tiago é uma honra ver você aqui!
      Obrigada por sua visita.
      Sim, finalmente um filme mais ou menos num mar de filmes menos menos, hahahaha.
      Volte sempre!

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