Estrada de Ossos. Resenha + Entrevista com a Autora! | Literatura



Eu sou completamente apaixonada por histórias de aventura. Principalmente pra ler em dias ruins. Me tira do lugar, me leva pra experimentar coisas boas e me faz bem.

Num desses dias ruins, vasculhando o grupo do Wattpad, me veio mais uma vez as notificações da Bruna. Daí que eu dei chance pra história dela. Disse a mim mesma "ou eu leio esse raio de estrada de ossos agora, ou eu vou ficar na curiosidade pra saber que diacho é isso".  Porque o marketing da Bruna é algo a ser apreciado. Pensa numa coisa bem feita.

Daí que eu me surpreendi.

Eu tinha que ler Estrada de Ossos pra levar pra vida. E eu tinha que me identificar com a Catarina. E todo mundo tem que ler. E é por isso que eu fiz questão de resenhar essa história tão bem escrita e trabalhada. Porque a Bruna merece, e nós também.

Estrada de Ossos




Dizem que ela vive entre os declives de granito decomposto no território dos índios tarahumara.
Dizem que ela está enterrada na periferia de Phoenix, perto de um poço.
Dizem que vive parada na estrada perto de El Paso, que pega carona com caminhoneiros até o México, ou que foi vista indo para a feira acima de Oaxaca, com galhos de lenha de estranhos formatos nas costas.
Ela é conhecida por muitos nomes: la Huesera, ou a Mulher dos Ossos, la Trapera, ou a Trapeira, e la Loba, ou a Mulher Loba.
     
Catarina recebe um estranho telefonema em sua última noite.
Uma misteriosa proposta de trabalho.
"Só mais uma noite", dissera a voz do outro lado da linha. "Viva só mais uma noite".
Ela nunca imaginaria que aceitar "mais uma noite" significava que toda a sua vida seria mudada.
          Não só por uma noite.
          Para sempre. Seu único ofício é o de recolher ossos, e junto ao fogo, a Mulher dos Ossos canta, e ali a magia se faz.           

O livro 1, (Ou a primeira parte, não sei quais são os planos da autora. Ainda.) tem 24 capítulos (com o mais novo epílogo) e também dois contos. Pra você se situar um pouco na história.

Da categoria Aventura, o livro aborda sobre arqueologia e lendas americanas maravilhosas. (Eu adoro.)

Atualmente com 2.6K de leituras e da última vez que vi, 55ª posição no ranking Aventura.


Experiência

De início a trama parece ser algo como; aquelas histórias de aventura que vão te inserir em universos expandidos gostosos e maravilhosos, tão bem estruturados que dão água na boca. (Só de ler os dois contos do livro, eu me empolguei.) Mas a Bruna tem mais do que isso pra gente. Estrada de Ossos tem um leque de sentimentos, cheiros, gostos e diálogos tão profundos quantos os dilemas dos personagens. Todos tem um motivo pra estar ali. Todos são extremamente profundos e cheios de personalidade.

São extremamente humanos.

Principalmente Catarina.

Ela é o personagem mais genuíno que eu pude ler sobre transtornos psicológicos. Bruna sabe lhe deixar incrivelmente sentido com tudo o que Catarina pode ser em apenas um capítulo. Ler sobre as tristezas dessa personagem me trouxe uma experiência intensa sobre depressão e suicídio. A autora sabe, decididamente, descrever cenas com sentimentos. Você vai sentir o desconforto da depressão vindo sobre seu estômago. E não é nada bonito. Ou romântico, como os livros que você anda lendo por ai.

E a linha segue dessa forma. Bruna tece a história ao redor de lendas e ambientes inspiradores. Você se sente inserido na história de uma forma a se confundir com os personagens. (Cenas que lhe dão falta de ar, por exemplo.) E os personagens secundários são ótimos. E tem cachorros. Só de ter cachorros já vale a leitura.

Eu não vou me estender sobre o que é exatamente a Estrada de Ossos, porque a Bruna é a única que pode contar isso pra gente, e ela ainda não teve tempo pra contar o que é. Então a curiosidade só aumenta e você vai realmente ter que ler pra entender um pouquinho. Sim, isso mesmo. Vá ler.


Personagens com transtornos psicológicos

Eu realmente odiei o tumblr por causa disso. Muitas fanfics/histórias que abordam esse tema, são romantizadas. Principalmente porque o público do tumblr influenciou muito sobre isso nos anos 2010/2011. Digo porque era o conteúdo que eu mais consumia.

Personagens rasos em suas dores, que acham que depressão é o crush dizer que não o ama. E... Vocês sabem o roteiro. E aqueles textos sobre mutilação, extremamente superficiais, que todo mundo encarava como uma forma de chamar atenção.

Não culpo totalmente essa galera por isso. A falta de informação atinge até quem sofre com essa doença. E todas as outras doenças psicológicas que são romantizadas, como a psicopatia. (Talvez um texto bem extenso sobre isso mais pra frente?)

O ponto aqui é: Estrada de Ossos aborda esse tema com veracidade. Não espere ver coisas frufru sobre isso. E isso é muito bom. Eu realmente me orgulho da forma como isso foi feito. (Um grande ponto pra você, Bruna.) A fidelidade com a vida, e a forma como Catarina cataliza as coisas que sente, foi um dos pontos que me fizeram engolir esse livro em poucos dias. — E olha que a Bruna escreve muito. Muitas palavras por capítulo. — E nessa onda de personagens "problemáticos" que são totalmente irresponsáveis com quem sofre de transtornos mentais, acabam deturpando toda a ideia de uma busca por ajuda. Então, tratar disso com um mínimo de cautela é... Aliviador.

Entrevista com a Autora

Como eu não sou besta, nem nada, aproveitei pra perguntar umas coisas pra jovem. E acabou que saiu uma pequena bíblia. (Ela pode.)

SK: Qual sua motivação pra escrever?

BK: Minha motivação para escrever é manter a minha sanidade. Minha cabeça não se organiza sozinha, ela só se organiza quando eu escrevo as coisas, e daí elas passam a existir na folha do caderno, no guardanapo, no pedaço rasgado de papel... Eu carrego na minha bolsa um caderno comigo. Se eu precisar escrever e não conseguir eu entro em pânico. Geralmente literalmente.

SK: Qual sua posição sobre romantização de transtornos psicológicos?

BK: Acho que isso tem várias categorias.
A categoria "idiota" pra mim é bem inofensiva. Aqueles que falam sobre psicopatas, acham que são psicopatas e fazem textos absurdos sobre isso. Acontece, toda criança passa por um período em que pensa na morte, na vida, na impermanência. São bobos, patetas. O mais absurdo que eu já ouvi foi sobre uma história em que um psicopata e uma suicida se apaixonam. E a frase de efeito era "era o amor perfeito, porque ele mataria por ela, e ela, morreria por ele". A primeira coisa sobre psicopatas é o fato de eles não amarem. Eles não têm empatia! Como vão amar alguém? Eles nem sequer entendem piadas, ironia... eles são diferentes, e, pra falar a verdade, bastante tediosos, a não ser que a pessoa ache interessante descrever mortes. Mas, como eu disse, as pessoas passam por isso no crescimento. 
Depois temos a categoria dos "sou foda porque estou escrevendo sobre um assunto sério". Mas eles não sabem nada sobre transtornos afetivos, de humor, emocionais. Sofrer de ansiedade não é ficar nervoso antes da prova, ou ficar roendo as unhas naquele "visualizado e não respondido". Sofrer de ansiedade é viver em paranoia, achando que você deixou o forno ligado, e você levanta vinte vezes da cama (porque você já não consegue dormir, mesmo) para checar se ele está MESMO desligado. Sofrer de ansiedade é sentir o seu corpo vibrar o tempo todo, constantemente. É viver com uma dor de cabeça e dor de estômago que remédio nenhum coloca fim. É sentir tontura, é sentir-se desligado da gravidade, como se você fosse sublimar de tanto que você treme. 
Essa categoria é desrespeitosa, e trabalha muito com a romantização. Eles escrevem livros que têm muito público, e todos muito influenciáveis. 
Meu psiquiatra me disse uma vez que 90% das pessoas que vão se consultar não sofrem de distúrbio algum, mas querem ter alguma coisa, porque está "na moda".
Agora saiu aquela série "13 razões". Dizem que foi romantização, dizem que não foi...
Um fato que eu vi foi que, depois da série, a procura por centros de prevenção de suicídio subiu mais de 300%. Romantizando ou não, ela abordou o tema do jeito que as pessoas gostam: uma série "inofensiva, bonitinha, com os adolescentes coitadinhos que as meninas querem cuidar e as "gostosas" que os meninos querem ver." 
Não acho que toda abordagem sobre esses transtornos precisam ser sérias como textos acadêmicos. Nós na verdade já temos isso. Um livro muito bom é o "Demônio do meio-dia" . Ele fala tuuuuudo e mais um pouco sobre esses transtornos. Minha mãe tentou ler para "me entender". Ela não só não conseguiu, como criou nela uma confiança inconsciente de que, apesar de não ter lido tudo, ela SABE sobre o assunto. 
Para as pessoas que sofrem disso, a pior coisa é alguém que acha que sabe. Essas pessoas só pioram a situação, sempre. Qual a dificuldade de perguntar para o seu filho, por exemplo, como ele se sente, e acreditar, para variar? 
Por que tudo tem que ser considerado preguiça, manha, vontade de chamar atenção ou qualquer dessas coisas estúpidas que acham que a gente faz, como se a sofrer fosse super divertido. 
O livro sério não ajudou muito. 
A romantização, a mitologia da menina depressiva que encontra salvação no amor da vida dela, também não ajudou nada. 
Falar sobre suicídio é seco e direto. Pode até parecer insensível. 
Mas uma coisa é você tentar entender os sentimentos de alguém, outra coisa é você finalmente entender que isso MATA. E a morte é mais fácil de entender. 
se houve romantização, não sei, não vi ainda, mas o assunto está vindo à tona, vai continuar aumentando, e vai sempre sair as versões merda e as versões boas sobre o assunto. 
Mas, se precisamos de algumas romantizações para que a sociedade aceite que isso existe, que isso é alarmante, e que isso MATA, acho que vale os enjoos diante dos materiais ruins...
Acho que a romantização sobre transtornos afetivos, de humor, emocionais, etc, e posso estar arriscando meu pescoço por causa disso, não é tão grave quanto a romantização da violência contra a mulher. O romantismo é a literatura do drama. Do quanto sentir-se à beira da morte é inspirador. Do quanto ser dramático sobre as coisas é glamouroso. Bem, eu prefiro alguém fazendo drama do que escondendo. Quem grita é o que menos tem problema, e isso é uma coisa real para a emergência socorrer pessoas em um acidente de carro, por exemplo. Se a pessoa está fazendo um escândalo, ela está bem o suficiente para isso. A prioridade são os que estão em silêncio. A depressão emudece. A depressão nos invisibiliza. Ficamos numa tangente da existência. Somos rejeitados pra qualquer lado que fomos. Se eu fico em casa ao invés de ir numa festa, eu estou propositalmente me fazendo ficar deprimida por preferir minha cama. Se eu vou na festa e fico no canto, desconfortável, e peço para ir embora, eu sou o estraga prazeres. 
Depressão já é ausência de vida. De viço. De vontade. 
A depressão é forte em si. 
Não consigo imaginar alguém sendo impelido a se suicidar por causa de um livro burro, especialmente porque se a pessoa com depressão lê um livro que romantiza o seu problema, ela vai largar o livro! 
Mas a romantização da violência é desastrosa. Meninas em fila, frenéticas, loucas, falando que querem pertencer a um homem. Pertencer! Serem escravas! Apanharem de um maluco mal resolvido que precisa urgentemente de tratamento. Romantizam o ciúme, o stalker, a fúria, o descontrole como prova de amor. Não, gente, isso aí precisa de tratamento! E por causa da fama, muitas pessoas nem sabem que sofrem num relacionamento abusivo, porque o livro fala que é normal, que é lindo, que é amor.
Não tem como falar que suicídio é legal e realmente convencer a pessoa a SER depressiva. Pode agravar um caso. Mas estamos falando de morte! Não tem como disfarçar muito, mesmo com romantização.

                                                     

Se vocês leram todo esse monólogo da Bruna, é claro que vocês vão ler Estrada de Ossos. Esperam que vocês se encantem com a história que a autora tem pra contar, assim como eu. E por favor, deixem comentários pra ela aqui no Sayen King. Pra ela se sentir bem amada mesmo.

Disponível na plataforma Wattpad


Boa sorte e boa viagem! 

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